sexta-feira, 14 de maio de 2010

A Escapada

O final de semana prolongado se aproxima, nenhuma atividade satisfatória na cidade, totalmente isolado pelos amigos que se mantinham amarrados aos sentimentos mútuos, Zé Roberto decide respirar um novo ar, conhecer novas mulheres, novos perfumes, viver emoções baratas e sai de Rio Preto e dirige-se pra casa de seus familiares distantes no litoral. Como bom caiçara que é, talvez um tanto quanto enferrujado, coloca na sua bagagem short floral, sandália de dedo e muito otimismo.
Depois de horas de viagem chega de madrugada, bem disposto e com um sorriso no rosto. Aproveita o finalzinho da noite já na casa dos parentes, dormi. Durante o dia mata a saudade do mar porque no mar você se sente melhor.
Escurece e Zé Roberto não sabia que aquela noite seria um marco na sua história. Fazia anos que nosso amigo não se relacionava com seus parentes, inclusive suas “priminhas” que agora haviam crescido.
Zé Roberto e sua prima estavam decidindo que rumo a noite tomaria, até que chegam num consenso, a noite seria repleta de música boa ou ruim dependendo das condições monetárias dos seus bolsos e pela falta de vergonha na cara, pois estavam indo para um karaoquê, mas o estranho foi que a sua prima parecia apreensiva e perguntava se ele não se importava de ir em lugares “diferentes”, ele sem entender respondeu que não.
Chegando ao karaoquê, tudo ia muito bem, um lugar aconchegante, bebida barata, mas uma estranha sensação tomou conta de Zé Roberto, olhando minuciosamente no ambiente notou algo de errado, mas preferiu ficar quieto.
Conversando com sua prima sobre assuntos banais em um momento ele percebe uma moça se aproximando, de repente sua prima levanta e ele sem entender o que acontecia ficou apreensivo, a sensação era que estava no meio de um fogo cruzado, sua prima e a estranha moça se aproximavam. Uma delas com uma pegada mais forte segura a nuca da outra e se aproxima lentamente do rosto, o momento é de tensão, Zé Roberto que tinha uma visão infantil da sua prima estava prestes a presenciar uma relação afetiva, rostos colados, mãos nas nucas e finalmente o beijo, ali se confirmaria a sua suspeita sobre o ambiente. O karaokê era um point gay, mulheres com atração por mulheres.
A noite estava apenas começando e Zé Roberto que não tem nenhum tipo de preconceito resolve aproveitar a noite, pôs o saco de pão no rosto e resolveu cantar umas músicas. Dinheiro na máquina. Escolheu a música do seu vasto repertório começando com Legião Urbana, levando as mulheres, “homens-mulheres” ao delírio. Estava se sentindo um músico do clube das “mulheres”.
Depois de umas cinco músicas resolve sentar, o bar enlouquecido, ovacionava-o e pedia bis. Aquela disposição para cantar acabou por despertar interesses alheios de alguns presentes.
Já sentado na mesa, tudo corria bem quando... discretamente uma mulher de sobrancelhas fortes, moletom, correntes, boné e um tanto quanto masculinizada se aproxima, ela parece conhecer a namorada da prima, pede para sentar, inicia-se um papo informal. Até que a nova convidada vira para o Zé Roberto, começa a falar mais pertinho e baixinho, ele não tinha afinidade com mulheres masculinizadas e se sentiu pouco a vontade até que, percebeu que aquela conversa começava a tomar rumos diferentes. Conversas mais ao pé do ouvido, gesticulação com passadinhas de mão na perna, tudo ficava muito estranho para Zé Roberto até que depois de algumas horas, vários pedidos para o garçom de bebidas baratas, mentes já desconcentradas, poucas formalidades, e a convidada já mais a vontade resolve ser mais direta. Ela olha fixamente nos olhos do Zé Roberto, pega na sua coxa dá aquela apertadinha e diz sem pudor e sem o mínimo de sutileza: Quero Beijar sua boca e fazer loucuras com você, gatinho! Topa?
Uma ânsia estomacal tomou conta do Zé Roberto, estava ele ali sentado com uma das situações mais constrangedoras que lhe acontecera até o momento. Zé Roberto manteve a calma, pensou um pouco durante alguns segundos, olhou para moça masculinizada, olhou para cerveja e falou: vou ao banheiro.
Em um momento solitário no miquitório, ele pensava e encontrou a resposta para a pergunta pouco discreta, mas ao mesmo tempo se questionava e sabia o quão era difícil pra um homem falar aquilo e por outro lado achava que seria engraçado e diferente, se vamos viver emoções baratas, que seja!
Voltou com as mãos no bolso, convicto da sua resposta, chegou na mesa, todos o olhavam com ansiedade, corações palpitavam mais fortes, a cerveja já descia como água.
Zé Roberto puxou a cadeira perto da moça, sentou, deu aquela cruzadinha de perna, levou o braço até os ombros da moça, olhou nos seus olhos e disse: Queridinha. Eu sou Gay.
Para um homem a sensação de ouvir isso de uma mulher parece ser normal, mas uma mulher ouvir isso de um homem deve ser frustrante, porque essa era a feição da moça masculinizada, ela olhou pra baixo totalmente desconsolada, sua noite de investimento foi totalmente em vão, só lhe resta dar as costas e procurar outra emoção. Ela se levanta, despede-se e sai chutando tampinhas do chão.
Depois de mais um tempo no bar, Zé Roberto e sua prima deixam o local e caem no riso, eles param em um buteko a beira-mar e se divertem com o acontecido. Sua prima não acredita que teve esse jogo de cintura e resolve apresentar todas as suas amigas heterossexuais pra ele, afinal ele foi muito homem pra falar aquilo e merecia uma recompensa, no outro dia as emoções que ele procurava foram encontradas e hoje muitas mulheres de lá, têm saudades de cá.

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